Laicidade: O que significará para a sociedade a ‘REDEFINIÇÃO
pelo estado do conceito do casamento entre um homem e uma mulher?
Artigo escrito 2014 pelo articulista Rodrigo Constantino, uma
resenha do livro "What is mariage", que serve como base para
interessantes reflexões contemporâneas sobre 'casamento' gay.
Véspera de Carnaval, a festa da carne (como o nome diz), do
hedonismo, e lá vou eu remar contra a maré e escrever um longo texto em defesa
do casamento tradicional, aquele entre homem e mulher “até que a morte nos
separe”. Trata-se de uma resenha do livro What is Mariage?, de Sherif Girgis,
Ryan Anderson e Robert George, que traz reflexões interessantes.
Os autores sustentam que uma união completa entre um homem e
uma mulher é boa em si mesma, mas que é seu elo com o bem-estar das crianças
que torna o casamento um bem público que deve ser reconhecido e estimulado pelo
estado. É o que chamam de visão conjugal do casamento, em contrapartida à visão
revisionista, que chama de casamento uma união emocional entre quaisquer
adultos.
Casamentos, segundo os autores, sempre foram os meios mais
eficazes de se gerar crianças saudáveis, felizes e bem educadas. E a saúde da
própria sociedade, alegam, depende de crianças saudáveis, felizes e bem
educadas. O livro não é sobre a homossexualidade ou algo do tipo, e sim sobre a
tentativa de se redefinir este conceito tradicional de casamento, que os
autores consideram importante para o bem comum.
Tampouco é um livro com uma defesa religiosa do casamento
tradicional. Os autores lembram que todas as culturas acabaram desenvolvendo
leis sobre o casamento, uma instituição natural, e que ele é que acabou
ajudando a moldar nossas religiões ou tradições filosóficas. A defesa que fazem
do casamento, portanto, é filosófica e sociológica, não religiosa.
Mesmo em culturas amigáveis ao homoerotismo, como na Grécia
antiga, uma visão similar a que existe hoje de casamento já prevalecia, e nada
como casamento de pessoas do mesmo sexo era sequer concebido.
Para os autores, isso se deve ao fato de que as sociedades
dependem de famílias criadas em casamentos sólidos para produzir aquilo que
necessitam, mas não podem garantir por outro meio, inclusive o estatal:
crianças saudáveis que se tornam cidadãos conscientes.
O casamento conjugal, portanto, deve incluir esta visão
familiar, atrelada à procriação. Por isso que os códigos legais sempre
consideraram o coito como indicativo do casamento consumado. A ausência do
coito permitia a anulação do casamento por parte da mulher. Uma união completa,
de corpo e alma, com um propósito comum ao homem e à mulher que pretendem dar
início a uma nova família: eis o que defendem como casamento.
Se casamento, como querem os revisionistas, passa a
significar apenas uma união centrada na emoção, ao invés de inerentemente
voltada à vida familiar, fica muito mais difícil mostrar por que o estado
deveria se intrometer nele e não nas amizades, por exemplo. O sexo se torna
fundamental para definir um casamento e separá-lo de outros relacionamentos,
como mesmo os revisionistas concordam. Mas os autores argumentam que apenas o
elo com a família, as crianças, justificaram a intromissão estatal nos
casamentos, em quase todas as culturas.
Quando ocorre essa mudança de conceito da família para as
emoções, fica impossível, mesmo para os revisionistas, explicar por que o casamento
ficaria restrito a duas pessoas. E o “poliamor”? E aqueles que desejam mais
companheiros, e gostariam de casar com todos eles? Por que eles deveriam ficar
impedidos de também participar do que chamamos casamento?
De fato, como mostram os autores, vários revisionistas mais
radicais já têm partido para essa defesa, julgando que o casamento deve abarcar
também parceiros múltiplos. Relacionamentos não-sexuais também seriam incluídos
como casamento. Os revisionistas não conseguem explicar porque pessoas do mesmo
sexo poderiam casar, mas amigos que não praticam sexo, mas vivem juntos, não.
A defesa que o livro faz, portanto, é do casamento como uma
união completa de duas pessoas, um homem e uma mulher, em sua mais básica
dimensão, em suas mentes e corpos, com exclusividade e de forma permanente. Em
segundo lugar, ele as une com a intenção de procriar também, criar uma nova
família.
Tanto a sociologia como o bom senso mostram que a
estabilidade familiar é positiva para os filhos. Vários estudos apontados no
livro corroboram com a conclusão de que filhos de pais biológicos casados
apresentam, na média, desempenho melhor em vários quesitos, e menos risco de
problemas de agressividade, com drogas ou suicídio. Não é uma realidade para
todos, e sim uma tendência, uma regra que comporta suas exceções.
Justamente por isso o casamento tradicional cria dificuldades
para o divórcio e demanda fidelidade (exclusividade) entre marido e mulher. O
divórcio subtrai muitas vezes a estabilidade familiar e retira as crianças do
convívio diário com seus pais biológicos, e a infidelidade divide a atenção das
crianças com outra pessoa, reduzindo seus cuidados.
Se por um lado o casamento é tão importante para a sociedade,
por outro lado, argumentam os autores, ele é custoso e frágil, e necessita de
uma cultura forte que o defenda e da pressão social para que as pessoas casem e
permaneçam casadas. O sociólogo James Q. Wilson definiu o casamento como “uma
solução social arranjada para o problema de fazer as pessoas continuarem juntas
e cuidarem das crianças, que o mero desejo por crianças, e o sexo que torna as
crianças possíveis, não resolvem”.
Pode ser uma visão pouco romântica da coisa, mas a verdade é
que, sem uma cultura que enalteça e valorize o casamento, sua manutenção pode
ficar prejudicada. E, como os estudos dos sociólogos mostram, isso não é isento
de custo para a sociedade como um todo. Filhos de mães solteiras, por exemplo,
enfrentam dificuldades maiores do que filhos com ambos os pais em casa, de
forma geral. Esse fardo costuma ser muito maior nas comunidades mais pobres,
afetadas de maneira desigual. O livro Coming Apart, de Charles Murray, mostra
claramente isso.
Não é preciso concordar com todos os pontos dos autores para
compreender a importância do casamento tradicional e os riscos que ele corre
atualmente. Um reductio ad absurdum pode ser útil aqui: se todos passassem a
desprezar o casamento tradicional, qual seria o efeito disso para a sociedade?
Talvez a melhor resposta esteja na distopia de Aldous Huxley, Admirável Mundo
Novo, onde os bebês são criados em incubadoras estatais e o próprio conceito de
mãe biológica é estranho e desperta até ojeriza. Lembrem que há revisionistas
que já querem retirar “pai e mãe” de documentos oficiais, para não “ofender”
aqueles com configuração “familiar” diferente.
Também não é preciso abraçar in toto os argumentos dos
autores, muito menos ter alguma inclinação religiosa, para lamentar o
crescimento exponencial na taxa de divórcio das sociedades modernas. Eu mesmo,
que já me divorciei, sei como o processo é traumático para os envolvidos,
especialmente os filhos (felizmente, após 3 anos, nos casamos novamente – e a
juíza, nos dando bronca, disse que nunca mais queria nos ver ali novamente, o
que pretendo obedecer).
A flexibilização do conceito de casamento, portanto, para
focar apenas em seu aspecto emocional e nada mais, pode ter conseqüências
não-intencionais que a sociedade não consegue ainda vislumbrar. Um dos riscos
que os autores levantam é o aumento excessivo do estado, convocado a se
intrometer cada vez mais nos assuntos íntimos para preencher o vácuo deixado
pela ruptura do casamento. Inúmeras formas diferentes de conjugação demandam
mais e mais regras e arbítrio estatal para selar disputas de toda natureza:
herança, visitas, guarda, barrigas de aluguel, pais biológicos e adotivos, pai
e “mãe” gays, relacionamentos com múltiplos parceiros, etc.
Os autores não rejeitam praticamente nenhuma vantagem típica
do casamento para os homossexuais ou mesmo os que praticam o “poliamor”. Apenas
entendem que há contratos privados que um estado laico pode resguardar nesses
casos, preservando, assim, o conceito legal de casamento para sua visão
tradicional, um contrato de um tipo muito especial, o que seria vantajoso para
a sociedade como um todo. Não são poucos os gays que compreendem esse ponto de
vista. No Brasil mesmo, Clodovil era um que costumava elogiar a família
tradicional, lembrando que todo homossexual vem de uma, e chegou a rejeitar
abertamente a libertinagem.
Em uma época quando muito se fala sobre diversidade, seria
bom cobrar justamente a responsabilidade pelas diferentes escolhas e suas
conseqüências. Por que os adeptos do “poliamor” precisam ser enquadrados no
conceito de casamento também? Não bastaria ser livre para viver com seu estilo
de “amar”? Tem que ser igual aos casais tradicionais? Vão querer entrar em
grupo na igreja ao som da magnífica marcha de Mandelssohn? Adotar filhos em
conjunto?
Enfim, entendo que o tema seja polêmico, e nem eu tenho forte
opinião formada sobre quais deveriam ser os aspectos legais que definem um
casamento. O que não me impediu de apreciar a leitura e as reflexões que ela
suscitou. Afinal, valorizo o casamento tradicional como um ideal a ser seguido.
Em tempos de Carnaval e hedonismo, de apetites e emoções como os únicos guias
das ações individuais, de promiscuidade total, não deixa de ser confortante ler
uma visão clássica sobre o bom e velho casamento. Que seja eterno enquanto
dure. E que dure para sempre!
Rodrigo Constantino
Jaime Francisco é criador deste site. É Apologista Católico, Historiador, Estudioso da Igreja Primitiva e das doutrinas protestantes no Brasil e na América Latina. Publicou 03 obras em defesa da Fé Católica: "As diferenças entre Igreja Católica e Igrejas Protestantes" " Porque estes Protestantes tornaram - se Católicos" e " Lavagem Cerebral e Hipnose no meio Protestante" Maiores informações sobre os livros: www.respostascatolicas.webnode.com.br Nestes últimos anos tem estudado profundamente sobre Psicologia e fenômenos relacionados à demônologia.